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Exegese de João 1. 29-34

1.    Introdução

Para levar a crer que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, o evangelho foi escrito (cf. Jo 20,30-31). Mesmo com essa finalidade explicitada na voz do narrador, o livro foi escrito, não como um tratado de teologia, mas como “evangelho”. Trata-se de um gênero literário específico: relata o que aconteceu desde os dias de João Batista até ao dia em que o Senhor Jesus passou para a glória do Pai (cf. At 1,21-22). A obra se apresenta como um testemunho, e é certo que o evangelista quis compor um verdadeiro evangelho narrativo[1].
 
Dentro da estrutura narrativa do evangelho, queremos verificar uma perícope[2] para controlar o significado teológico do título Filho de Deus nas perícopes iniciais do evangelho (1,19-51), os títulos são atribuídos a Jesus por João Batista e pelos primeiros discípulos.
Qual o significado teológico dos títulos usados por João Batista em 1,29-34? Possuem um significado messiânico, reproduzindo a baixa cristologia tradicional, ou revelam a divindade de Jesus, característica do Quarto Evangelho?


2.    DELIMITAÇÃO DO TEXTO

A perícope de João 1: 29-34 é precedida pela perícope delimitada pelos versículos 19-28 que tem uma ligação direta (de continuidade)[3] com a parte estudada neste trabalho, que contribui para uma melhor compreensão da passagem.

Texto:

JOÃO 1: 29-34 – Versão Almeida Corrigida e Revisada Fiel / Versão Grega

V. 29 - No dia seguinte João viu a Jesus, que vinha para ele, e disse: Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo.

V.29 - Τη επαυριον βλεπει ο Ιωαννης τον Ιησουν ερχομενον προς αυτον και λεγει· Ιδου, ο Αμνος του Θεου ο αιρων την αμαρτιαν του κοσμου.

V.30 - Este é aquele do qual eu disse: Após mim vem um homem que é antes de mim, porque foi primeiro do que eu.
V.30 - Ουτος ειναι περι ου εγω ειπον· Οπισω μου ερχεται ανηρ, οστις ειναι ανωτερος μου, διοτι ητο προτερος μου.

V. 31 - E eu não o conhecia; mas, para que ele fosse manifestado a Israel, vim eu, por isso, batizando com água.
V.31 - Και εγω δεν εγνωριζον αυτον, αλλα δια να φανερωθη εις τον Ισραηλ, δια τουτο ηλθον εγω βαπτιζων εν τω υδατι.

V.32 - E João testificou, dizendo: Eu vi o Espírito descer do céu como pomba, e repousar sobre ele.
V.32 - Και εμαρτυρησεν ο Ιωαννης, λεγων οτι Ειδον το Πνευμα καταβαινον ως περιστεραν εξ ουρανου και εμεινεν επ' αυτον.

V.33 - E eu não o conhecia, mas o que me mandou a batizar com água, esse me disse: Sobre aquele que vires descer o Espírito, e sobre ele repousar, esse é o que batiza com o Espírito Santo.
V.33 - Και εγω δεν εγνωριζον αυτον· αλλ' ο πεμψας με δια να βαπτιζω εν υδατι εκεινος μοι ειπεν· εις οντινα ιδης το Πνευμα καταβαινον και μενον επ' αυτον, ουτος ειναι ο βαπτιζων εν Πνευματι Αγιω.

V.34 - E eu vi, e tenho testificado que este é o Filho de Deus.
V.34 - Και εγω ειδον και εμαρτυρησα, οτι ουτος ειναι ο Υιος του Θεου.

3. ESTRUTURA DO TEXTO
A perícope se apresenta da seguinte forma:

1: 29-31         João Batista  repete seu testemunho e apresenta Jesus como “CORDEIRO DE DEUS[4]” que tira o pecado do mundo.
1: 32               O sinal de Deus que evidência o poder messiânico de Jesus[5]
1: 33-34         Comparação entre o batismo de João Batista com o batismo de Jesus Cristo.

4.    ANÁLISE DO CONTEXTO
Depois de um período de aproximadamente quatro séculos em que Deus não se comunicava com o povo através de profetas, surge João Batista, filho de Zacarias e Isabel (Lc1.57). João começa sua atividade profética em torno de 27d.C. Chamou o povo ao arrependimento, e as multidões se ajuntaram para escutá-lo. João também batizou muitos no rio Jordão (Mt 3.1-12; Lc 3.1-20) incluindo Jesus, a quem reconheceu como Messias e cujo caminho preparou  (Mt 3.1-12; Lc 3.21; Jo 1. 29-34). Mais tarde, Herodes Antipas o encarcerou e executou (Mt 14. 2-12)[6].

4.1 - Situação História

A destruição do templo de Jerusalém e o fim do culto com sacrifício em 70 d.C. Fez pouca diferença na vida dos judeus da dispersão. O debate entre os discípulos e as autoridades das sinagogas alcançou um estágio crítico por volta de 90 d.C, quando uma das orações no culto das sinagogas foi modificado para excluir definitivamente os seguidores de Jesus. Provavelmente é contra este pano de fundo que o quarto evangelho foi publicado[7]
Quanto ao autor percebe-se que era um autêntico judeu, profundamente religioso e bom conhecedor das tradições e expectativas do seu povo, mas um judeu que encontrou em Jesus de Nazaré o Messias esperado, o Salvador e Senhor, de quem Moisés escreveu na lei, e a quem se referiram os profetas. Contudo, não há muito informação acerca da pessoa deste evangelista. Diria até que o mesmo parece ocultar sua identidade, por trás de um anonimato apenas rompido quando se refere àquele discípulo “ a quem ele amava” (13.23; 19.26; 20.2; 21.20). A tradição que atribui so filho de Zebedeu, a João irmão de Tiago (Mc 3.17) retoma ao séc. II[8].

5.    ANÁLISE DOS ELEMENTOS TEOLÓGICOS DA PERÍCOPE

A simbologia e estrutura literária comunicam muito mais do que os fatos representam, mais do que o histórico registra. O significado dos fatos narrados está para além do factual, está na teologia transmitida pela narratividade. O seguimento de Jesus, portanto, começa nas primeiras perícopes do evangelho como programa de discernimento que será confirmado explicitamente mais adiante (“Eu sou a luz do mundo, quem me segue não caminha nas trevas mas terá a luz da vida” 8,12); e selado na voz do narrador do evangelho: “Estes sinais foram escritos para que creias...” (cf. 20,31). Os discípulos de João Batista seguiram Jesus, porque era o Messias esperado, ungido com o Espírito. Por reconhecerem em Jesus o “messias esperado”, os primeiros discípulos o seguem: os discípulos seguem Jesus (1.35-51) e todos os outros personagens serão colocados diante da escolha de “segui-lo” ou não. Essa escolha põe em foco a mensagem central do evangelho, isto é, da sua cristologia: crer que Jesus é o Cristo, “o Filho de Deus”.

5.1 - Qual o nível teológico do título “Filho de Deus” em1,34?

Superioridade de Jesus é afirmada na perícope pela noção de “preexistência” e pelo “Espírito que desce e permanece sobre ele” (vv.30.33). Ele é, evidentemente, o Ungido, “o Filho de Deus”.  “Unção do Espírito” é um tema explicitamente messiânico (cf. 2Sm 7,14; Sl 2,7). O mesmo se pode dizer do vocabulário batismal, presente na perícope18: João Batista não o conhecia (1,31), mas foi em vista exatamente de manifestá-lo a Israel que veio batizar na água. E aquele que enviou João a batizar na água disse: ‘Aquele sobre o qual vires o Espírito descer e permanecer sobre ele, é ele que batiza no Espírito Santo’. João Batista é enviado a batizar para manifestar a Israel aquele que ele
não conhece (v.31) e que existia antes dele (v.30). Jesus é aquele que “batiza no Espírito Santo”: Este é o “Filho de Deus”.


6.    REFERENCIA BIBLIOGRÁFICA

·         NOVO TESTAMENTO. Português. Tradução Ecumênica da Bíblia. Edição Integral. São Paulo: Loyola, 1987. Introdução ao Evangelho Segundo São João, p. 227.
·         WEGNER, 1998, p. 86.
·         MINCATO, Ramiro. 2005. Estrutura e Teologia da Perícope de João 1: 29-34, p. 840
·         BÍBLIA SHEDD. SP, 1997. Vida nova, p. 1484.
·         F.F Bruce. Português. João: Introdução e Comentário, 1987, p. 58. Mundo Cristão.
·         ALMEIDA, Bíblia de Estudo. Baueri-SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.


[1] NOVO TESTAMENTO. Português. Tradução Ecumênica da Bíblia. Edição Integral. São Paulo: Loyola, 1987. Introdução ao Evangelho Segundo São João, p. 227.
[2] Perícope: é um texto que constitui uma unidade autônoma quando seu conteúdo possui uma mensagem própria e característica, distinta da mensagem dos textos anteriores ou subsequentes. (WEGNER, 1998, p. 86).
[3] MINCATO, Ramiro. 2005. Estrutura e Teologia da Perícope de João 1: 29-34, p. 840
[4] Cordeiro de Deus. i.e, providenciado por Deus (cf Gn. 22.8; Rm 8: 32) Está frase ganhou significado para o judeu, do cordeiro pascal (Êx 12. Nm 9), do servo sofredor que, como cordeiro, é levado ao matadouro (Is 53. 7,8,12) e do sacrifício diário no templo. (BÍBLIA SHEDD. SP, 1997. Vida nova, p. 1484)
[5] O Espírito, ao descer sobre Jesus, identificou-o como o governante davídico de Isaias 11.1ss. (F.F Bruce. Português. João: Introdução e Comentário, 1987, p. 58. Mundo Cristão.
[6] ALMEIDA, Bíblia de Estudo. Baueri-SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.
[7] F.F Bruce. Português. João: Introdução e Comentário, 1987, p. 25. Mundo Cristão.
[8] ALMEIDA, Bíblia de Estudo. Baueri-SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999

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